Em resposta a parlamentares que dizem falar em nome
de Deus, mas têm defendido projetos de redução da maioridade penal de 18
para 16 anos, organizações ligadas a denominações evangélicas deram
início a uma campanha para alertar os fiéis, a sociedade e pressionar os
representantes políticos para que essa tragédia não aconteça.
Nesta semana, a Rede Evangélica Nacional de Ação
Social (Renas), a Visão Mundial, a rede Fale, que reúnem milhares de
ativistas em todo o país, além de pastores e líderes religiosos,
começaram a distribuir um documento a parlamentares evangélicos e a
igrejas.
“Nossa sociedade e o Estado têm negado o direito ao
pleno desenvolvimento das nossas crianças e adolescentes, do nascimento à
juventude. Nossos parlamentares e a sociedade em geral estaremos sendo
hipócritas ao propor a redução da idade penal enquanto não garantimos
todas as oportunidades de desenvolvimento para as nossas crianças e
adolescentes'', diz a carta.
Em tom forte, o documento também conclama “os
parlamentares, especialmente os que se declaram evangélicos, a se
posicionarem contra a redução da maioridade penal e se envolverem na
efetivação do ECA e do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo
(Sinase), cumprindo o nobre papel dessa Casa de fiscalizar e cobrar do
poder público o orçamento e a efetiva implementação dos instrumentos já
existentes''.
Conversei com representantes desse grupo. Eles temem
que uma união entre parlamentares evangélicos e a bancada da bala ajude
na aprovação dessa mudança. Trocas de favores em torno de uma agenda
conservadora individual dos parlamentares que não foi discutida com sua
base.
Enquanto certos parlamentares se preocupam com beijo
em novela, há grupos evangélicos articulados e com peso político que
chamam a atenção para a gravidade da situação da infância e da
adolescência no Brasil e o risco de um retrocesso patrocinado por essa
mudança na lei.
Considerando que esse pessoal consegue fazer um bom barulho nas igrejas (
há uma petição online circulando sobre o tema)
e que, até revogarem a Constituição, políticos precisam de votos para
sobreviver, vai ter parlamentar que terá que se explicar junto à sua
base porque dar as costas a crianças e adolescentes se tornou um valor
cristão.
Segue o documento:
Ao tomar conhecimento do debate na Comissão de
Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados, ocorrido esta
semana em Brasília, as organizações filiadas à RENAS, reunidas em
assembleia na cidade do Rio de Janeiro, de 18 a 20 de março, decidiram
unanimemente aprovar uma agenda de incidência política junto às igrejas
evangélicas brasileiras e aos parlamentares que compõe a CCJC,
especialmente aos que se declaram evangélicos.
Esperamos contar com a sensibilidade dos irmãos
deputados na esperança de que este seja um momento de testemunho em
favor da vida daqueles que Jesus considerou mais preciosos, as crianças e
adolescentes.
Convidamos parlamentares e comunidades evangélicas a considerarem conosco os seguintes pontos:
1. A partir dos 12 anos, todo
adolescente pode ser responsabilizado caso infrinja a lei. Essa
responsabilização, executada por meio de medidas socioeducativas
previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), tem o objetivo
de ajudá-lo a recomeçar e a prepará-lo para uma vida adulta
reconstruída.
2. O ECA prevê seis medidas
socioeducativas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de
serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação.
Recomenda-se que a medida seja aplicada de acordo com a capacidade de
cumpri-la, as circunstâncias do fato e a gravidade da infração. Muitos
adolescentes que são privados de sua liberdade não ficam em instituições
preparadas para sua reeducação, mas em locais que reproduzem o ambiente
de uma prisão comum. Além disso, o adolescente pode ficar até 9 anos em
medidas socioeducativas, sendo três anos na internação, três em
semiliberdade e três em liberdade assistida, com a responsabilidade do
Estado de acompanhá-lo e ajudá-lo a se reinserir na sociedade. Não
adianta, portanto, endurecer as leis se o próprio Estado não as cumpre.
3. O Brasil tem a 3ª maior população
carcerária do mundo e um sistema prisional superlotado, com mais de 715
mil presos. Só fica atrás, em número de presos, de Estados Unidos (2,2
milhões) e China (1,7 milhões). O sistema penitenciário brasileiro não
tem cumprido sua função de controle, reinserção e reeducação. Assim,
enviar os jovens mais cedo para o sistema prisional é decretar a
falência de nossa sociedade em prover oportunidades de vida digna para
nossa juventude e condenar nosso futuro como nação.
4. Muitos estudos no campo da
criminologia e das ciências sociais têm demonstrado que não há relação
direta de causalidade entre a adoção de soluções punitivas e repressivas
e a diminuição dos índices de violência. No sentido contrário, no
entanto, se observa que são as políticas e ações de natureza social que
desempenham um papel importante na redução das taxas de criminalidade.
Dados do UNICEF revelam a experiência mal-sucedida dos Estados Unidos,
aplicando aos seus adolescentes penas previstas para adultos. Os jovens
que cumpriram pena em penitenciárias voltaram a delinquir e de forma
mais violenta. O resultado concreto para a sociedade foi o agravamento
da violência.
Nossa sociedade e o Estado têm negado o direito ao
pleno desenvolvimento das nossas crianças e adolescentes, do nascimento à
juventude. Nossos parlamentares e a sociedade em geral estaremos sendo
hipócritas ao propor a redução da idade penal enquanto não garantimos
todas as oportunidades de desenvolvimento para as nossas crianças e
adolescentes.
A juventude brasileira tem sido a maior vítima da
grande violência que ocorre em nossas cidades e não pode ser ainda mais
castigada como bode expiatório de uma sociedade e Estado negligentes com
seus direitos básicos. Conclamamos os parlamentares, especialmente os
que se declaram evangélicos, a se posicionarem contra a redução da
maioridade penal e se envolverem na efetivação do ECA e do Sistema
Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), cumprindo o nobre papel
dessa Casa de fiscalizar e cobrar do poder público o orçamento e a
efetiva implementação dos instrumentos já existentes.
Pelos motivos expostos e inspirados na vocação
profética da igreja, conclamamos os parlamentares e comunidades
evangélicas a se posicionarem em favor da vida de nossas crianças e
adolescentes, pois o Deus da vida enviou seu filho Jesus Cristo para dar
vida plena para todas as pessoas, em especial aos mais vulneráveis.
No decorrer da História, várias autoridades
decretaram a morte dos mais jovens, como o faraó no Egito, no tempo de
Moisés, e Herodes, no tempo do nascimento de Jesus. Conclamamos todos
vocês a se posicionarem do lado de Jesus – e não do Faraó ou de Herodes.
Em nome do Jesus de Nazaré, que teve sua vida ameaçada de morte ainda
criança, nos despedimos na esperança de que o Espírito Santo os guiará
no caminho da vida!