sábado, 14 de novembro de 2015

Capital Inicial - Vai e Vem ft. Seu Jorge


Confira o discurso de Francisco no Encontro Mundial dos Movimentos Populares





O II Encontro Mundial dos Movimentos Populares, ocorrido em Santa Cruz de La Sierra, Bolívia, de 7 a 9 de julho,  reuniu cerca de 1500 representantes de movimentos sociais que, durante os três dias, refletiram sobre o tema: “Mãe Terra, Moradia, Trabalho – Integração dos Povos”. A abertura do Encontro foi conduzida pelo presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz, cardeal Peter Turkson. O bispo de Ipameri (GO) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Guilherme Werlang, participou do painel: “O teto, a cidade e os movimentos populares”. No dia 9, o papa Francisco proferiu seu maior discurso desde o início da viagem pela América Latina. Leia, abaixo, a íntegra do pronunciamento do papa:
PARTICIPAÇÃO NO II ENCONTRO MUNDIAL DOS MOVIMENTOS POPULARES
DISCURSO DO SANTO PADRE
Expo Feira de Santa Cruz de la Sierra (Bolívia)
Quinta-feira, 9 de Julho de 2015

Irmãos e irmãs, boa tarde!
Há alguns meses, reunimo-nos em Roma e não esqueço aquele nosso primeiro encontro. Durante este tempo, trouxe-vos no meu coração e nas minhas orações. E alegra-me vê-vos de novo aqui, debatendo os melhores caminhos para superar as graves situações de injustiça que padecem os excluídos em todo o mundo. Obrigado Senhor Presidente Evo Morales, por sustentar tão decididamente este Encontro.
Então, em Roma, senti algo muito belo: fraternidade, paixão, entrega, sede de justiça. Hoje, em Santa Cruz de la Sierra, volto a sentir o mesmo. Obrigado! Soube também, pelo Pontifício Conselho «Justiça e Paz» presidido pelo Cardeal Turkson, que são muitos na Igreja aqueles que se sentem mais próximos dos movimentos populares. Muito me alegro por isso! Ver a Igreja com as portas abertas a todos vós, que se envolve, acompanha e consegue sistematizar em cada diocese, em cada comissão «Justiça e Paz», uma colaboração real, permanente e comprometida com os movimentos populares. Convido-vos a todos, bispos, sacerdotes e leigos, juntamente com as organizações sociais das periferias urbanas e rurais a aprofundar este encontro.
Deus permitiu que nos voltássemos a ver hoje. A Bíblia lembra-nos que Deus escuta o clamor do seu povo e também eu quero voltar a unir a minha voz à vossa: os famosos três “T”: terra, teto e trabalho para todos os nossos irmãos e irmãs. Disse-o e repito: são direitos sagrados. Vale a pena, vale a pena lutar por eles. Que o clamor dos excluídos seja escutado na América Latina e em toda a terra.
1. Em primeiro lugar, comecemos por reconhecer que precisamos duma mudança. Quero esclarecer, para que não haja mal-entendidos, que falo dos problemas comuns de todos os latino-americanos e, em geral, também de toda a humanidade. Problemas, que têm uma matriz global e que atualmente nenhum Estado pode resolver por si mesmo. Feito este esclarecimento, proponho que nos coloquemos estas perguntas:
- Reconhecemos nós, de verdade, que as coisas não andam bem num mundo onde há tantos camponeses sem terra, tantas famílias sem tecto, tantos trabalhadores sem direitos, tantas pessoas feridas na sua dignidade?
- Reconhecemos nós que as coisas não andam bem, quando explodem tantas guerras sem sentido e a violência fratricida se apodera até dos nossos bairros? Reconhecemos nós que as coisas não andam bem, quando o solo, a água, o ar e todos os seres da criação estão sob ameaça constante?
Então, se reconhecemos isto, digamo-lo sem medo: Precisamos e queremos uma mudança.
Nas vossas cartas e nos nossos encontros, relataram-me as múltiplas exclusões e injustiças que sofrem em cada atividade laboral, em cada bairro, em cada território. São tantas e tão variadas como muitas e diferentes são as formas próprias de as enfrentar. Mas há um elo invisível que une cada uma das exclusões. Não se encontram isoladas, estão unidas, por um fio invisível. Conseguimos nós reconhecê-lo? É que não se trata de questões isoladas. Pergunto-me se somos capazes de reconhecer que estas realidades destrutivas correspondem a um sistema que se tornou global. Reconhecemos nós que este sistema impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza?
Se isso é assim – insisto – digamo-lo sem medo: Queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável: não o suportam os camponeses, não o suportam os trabalhadores, não o suportam as comunidades, não o suportam os povos…. E nem sequer o suporta a Terra, a irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco.
Queremos uma mudança nas nossas vidas, nos nossos bairros, no vilarejo, na nossa realidade mais próxima; mas uma mudança que toque também o mundo inteiro, porque hoje a interdependência global requer respostas globais para os problemas locais. A globalização da esperança, que nasce dos povos e cresce entre os pobres, deve substituir esta globalização da exclusão e da indiferença.

Redução da Maioridade penal: O que Jesus faria?

[Nossa voz] Redução da Maioridade penal: O que Jesus faria?


Nossa voz 27.03
Por Maria Clara Leal[*]
Em meio às conversas sobre a redução da maioridade penal, como cristã, gosto de tentar viajar no tempo e imaginar: qual seria o posicionamento de Jesus?
Em muitos momentos não nos permitimos atualizar. É comum nos prendermos nos exemplos dos evangelhos, utilizando-os como referências para tentar aplicar na nossa realidade formas de lidar com as situações apresentadas a nós. Claro que isso não é um problema! Como cristãos, devemos nos apoiar nas sábias palavras e exemplos que preenchem os textos de João, Lucas, Marcos e Mateus, bem como outros da Bíblia. Mas às vezes caímos no famoso “copiar” e “colar” da atualidade.
Se agirmos desta forma, é fácil nos descobrirmos desprevenidos, pois o reinventar humano nos assusta com novos acontecimentos. Hoje, não temos só cobradores de impostos, não temos só prostitutas, não temos só deficientes e leprosos. O mundo moderno nos apresenta constantemente uma variedade de novas situações. A velocidade dos acontecimentos nos obriga a pensar e nos posicionar agilmente. Não sei, mas parece que muitas vezes essas novas situações nos colocam em enrascadas. Por não termos situações idênticas na Bíblia, ficamos perdidos.
Jesus Cristo viveu em outra época, outros desafios e situações. Mas algo que considero fantástico na sua história são seus momentos de retiro. As reflexões do jovem de Nazaré também são contadas pelos evangelhos. Ele subia nos montes para rezar, sentava com calma junto com seus apóstolos e se retirava como fez durante os quarenta dias no deserto. Seus posicionamentos também eram frutos de suas reflexões. Por que então refletimos tão pouco? Estamos sendo devorados pelo mundo instantâneo que vivemos, precisamos copiar rapidamente a resposta, mas não nos damos o espaço para refletir.
Essas peculiaridades de Cristo passam despercebidas quando buscamos atentamente na leitura de sua história as respostas rápidas, um guia de instruções. Quando fazemos isso, anulamos nossa capacidade inventiva, nos tornamos cristãos presos à época de Jesus e incapazes de atuar no mundo de hoje da forma que ele fez no seu espaço.
Quando não achamos as respostas rápidas na bíblia, quando não encontramos situações idênticas às nossas, quando não sabemos encontrar nas entrelinhas e nos gestos do nazareno as respostas, nos sentimos no direito de deixar os acontecimentos à parte, julgamos melhor não pensar sobre isso. Ou então, nos sentimos autorizados a copiar qualquer outra fala de alguém que pareça convincente, acabando por reproduzir discursos de ódio e repletos de sentimento de vingança e senso comum.
Nesses momentos, passamos a ocupar o lugar daqueles que pegavam as pedras para prontamente atacá-las em Maria Madalena. Mas, como cristãos, não deveríamos ocupar o lugar de Jesus Cristo? Daquele que olha para as lágrimas de quem sofre? Quando me vejo no primeiro lugar, me exijo o retiro, o encarando como um ensinamento do filho de Deus. Não para fugir da situação, mas para acalmar os sentimentos hostis que às vezes nos envolvem.
Mas e a redução da maioridade penal?
Eu não me lembro de ter algum dia me deparado com alguém que soubesse a resolução de Jesus para o problema, ou seja, na Bíblia não tem uma passagem que relata o que o jovem de
Nazaré fez ao encontrar um menor infrator. Este não era um ponto em questão nas terras pisadas por ele naquele tempo. Isso não permite que caiamos no erro de tomar como opinião o discurso corriqueiro, aquele dito pela mídia ou por alguma personalidade “bacana”.
Então, opino pela reflexão, e retorno ao início deste texto. Qual seria o posicionamento de Jesus?
Quando um crime praticado por um jovem acontece, um assalto ou a realização de qualquer ato danoso contra uma vítima, sentimos muito junto com ela e com razão. Essa identificação com a vítima muitas vezes nos leva ao discurso:
“Tem que reduzir a maioridade penal sim!”
“Bandido bom é bandido morto”
“Se tem idade para matar, tem para ir para a cadeia”.
Mas podemos sair do lugar de apedrejadores, vamos olhar a cena de longe. O lugar ocupado por Jesus Cristo está vazio, nele não deveriam estar os cristãos? Não para defender o erro de alguém, mas para reconhecer o humano apedrejado, as suas necessidades, o lugar que foi destinado e ocupado por ele e que pode ter o feito a acabar ali. Assim, podemos pensar nos movimentos anteriores, o que faz um jovem chegar naquele lugar. Será que a sociedade cuida do caminho percorrido por ele no seu desenvolvimento? Será que ele teve espaço para atingir o seu potencial? De repente, percebemos que a nossa sociedade parece tão injusta quanto a de Cristo e que sim, o evangelho nos ensina a lidar com essa situação.
Acho que era isso que o Jesus pensava quando se encontrava com os sujeitos que pareciam perdidos neles mesmos, “sem voz, sem vez, sem lugar”. As atitudes tomadas por ele nas situações de miséria humana sempre eram baseadas no respeito e amor. Quando Pilatos lavou as mãos na condenação de Cristo, ele o fez para todas essas propostas inovadoras e de compaixão defendidas pelo jovem de Nazaré. É mais fácil lavar as mãos e ignorar a ter que o ajudar nas transformações. Hoje, quando nos deparamos com a questão da redução da maioridade penal, temos dois caminhos: ser Pilatos ou Cireneu.
Quando refletimos como Jesus, podemos compreender o outro e experimentar sua visão diante da vida. Quando fazemos isso com cada jovem que tem seus direitos negados, que é pobre e marginalizado (pois é esse o perfil da maioria dos que cometem infrações no nosso país) compramos a causa cristã. Deixamos de ser Pilatos quando não lavamos as mãos e ajudamos o outro a carregar a sua cruz, como fez Cireneu. Hoje, nós somos convidados a defender o reino fraterno proposto por Jesus Cristo. Não reduzir a maioridade penal é abrir o espaço para novas propostas de lidar com o problema, é não se conformar com ele, assim como o filho de Deus não se conformou, bem como não naturalizou as práticas de sua época.
Quando fazemos isso, encontramos qual seria o posicionamento de Jesus e descobrimos que os evangelhos podem nos proporcionar mais do que imaginamos.
[*]Maria Clara Leal, 23 anos, é estudante de Psicologia e participa da Pastoral da Juventude da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, Conceição de Macabu/RJ. Também atua como voluntária na Pastoral da Criança e defensora dos direitos dos animais.

VIOLÊNCIA EM BELÉM: O QUE O DIA NACIONAL DA JUVENTUDE TEM HAVER COM ISSO?



Por Eduardo da Amazônia
Temos acompanhado na imprensa e nas redes sociais, a intensidade de notícias relacionadas à violência em Belém/PA. Não é novidade, nem particularidade da capital do Estado do Pará esta realidade presente na vida de cidadãos e cidadãs, seja pela vivência ou pelo sensacionalismo midiático de jornais impressos e programas televisivos.
Esse cenário tem colocado Belém na 7ª posição das capitais mais perigosas do Brasil, conforme o 9º Anuário de Segurança Pública do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, assim como a 18ª no ranking das cidades mais violentas do mundo, segundo a ONG Conselho Cidadão pela Seguridade Social Pública e Justiça Penal do México.
Grande parte dessas violências tem atingido principalmente adolescentes e jovens. O levantamento do Mapa da Violência divulgado esse ano sobre mortalidade por armas de fogo no Brasil aponta que 42.416 óbitos em 2012, 24.882 foram de pessoas entre 15 e 29 anos (59%), onde o Pará encontra-se no 10ª lugar. E Belém é apontada como a segunda capital onde a juventude corre mais risco de exposição à violência, segundo o Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência e Desigualdade Racial da pela Secretaria Nacional de Juventude e Ministério da Justiça.
No próximo domingo (01), a Arquidiocese de Belém, através do Setor Juventude estará realizando a celebração dos 30 anos do Dia Nacional da Juventude. A atividade que nos anos anteriores foi assumida principalmente pela Pastoral da Juventude, em parceria com outras organizações da igreja e da sociedade civil, agora é realizada em continuidade, pelas diversas expressões juvenis da Igreja Católica.
Historicamente, como parte do processo de educação na fé e em sintonia com a Campanha da Fraternidade e as orientações e diretrizes da Igreja no Brasil, o DNJ sempre reflete uma questão que atinge diretamente a vida da juventude. Em 2015, ele também retoma o primeiro tema de 1985: “Juventude construindo uma nova sociedade” e tem como inspiração bíblica: “Estou no meio de vós como aquele que serve” (Lc 22, 27).
Em sua visita à Cuba, durante a Santa Missa na Praça da Revolução (Havana), o Papa Francisco retoma a clássica frase na conclusão de sua homilia: “Quem não vive pra servir, não serve pra viver”. Então, na realidade que nos interpela, provocad@s pelo tema e referencial bíblico do DNJ, juntamente com as palavras do atual Pontífice, nos vem a pergunta: Como podemos enfrentar a violência e construir uma nova sociedade em Belém?
Coincidentemente a nossa cidade recebe o nome do lugar bíblico da acolhida e da “Casa do Pão”: Belém. A Pastoral da Juventude Arquidiocesana – PJA, resistindo através dos grupos de base, é esse lugar que acolhe @s jovens presentes principalmente nas comunidades e paróquias da periferia de Belém, com-partilhando o Evangelho e a vida através atividades formativas, artísticas, religiosas políticas e culturais. E o DNJ é uma destas experiências que nasce no chão da PJ, assumida como atividade permanente desde o início até os dias atuais, ampliando agora com o Setor Juventude. Entretanto, não basta apenas assumir o nome da atividade, mas a causa que ela se propõe!
Por ter como premissa o protagonismo juvenil e entendendo que o nome da atividade não utiliza as preposições “de” ou “para”, mas “da” juventude para indicar de quem pertence dia nacional, o DNJ sempre foi organizado pel@s jovens. Exclui-se as pessoas adultas? Não, pelo contrário, elas foram (e devem ser) acompanhantes que contribuem na promoção da autonomia da juventude. A figura d@ assessor(a) foi (e é) importante por manter viva a memória, iluminar caminhos e facilitar nas dificuldades o diálogo.
Desde 2009, esta atividade retoma um formato massivo, mas tendo como ponto de partida as reflexões nos grupos de base, por entendê-los como um “instrumento pedagógico de educação na fé” (Evangelização da Juventude: desafios e perspectivas Pastorais, n. 151 – CNBB, 2007/Doc. 85). Foi o ano que, vivenciando a Campanha Nacional Contra a Violência e Extermínio de Jovens, realizamos além das atividades preparatórias, um seminário, celebração e show cultural envolvendo a temática.
Em 2010, a PJA entendendo que esta também era uma atividade missionária, definiu levar o DNJ às periferias da arquidiocese. Neste sentido, com o tema e lema “DNJ 25 anos: celebrando a memória e transformando a história – Juventude: muita reza, muita luta, muita festa, em marcha contra a violência” o jubileu do DNJ aconteceu na Cabanagem. E seguimos com “Juventude e Protagonismo Feminino – Jovens mulheres tecendo relações de vida” em 2011 na Terra Firme, “Juventude e Vida – Que vida vale a pena ser vivida?” em 2012 em Marituba, “Juventude e Missão – Jovem, levante-se, seja fermento” em 2013 no Castanheira e em 2014 (agora apenas com o lema) “Feitos para sermos livres, não escravos” no Paar/Ananindeua.
Vejam como os temas dialogam com os problemas que tem atingido a juventude: extermínio de jovens, violência contra a mulher, tráfico de pessoas, entre outros (co)relacionados. E são problemas que continuam a ameaçar a vida da juventude. Isso quer dizer que nada o DNJ modificou? Não, até porque ele sozinho não conseguiria fazer as devidas mudanças sociais que local e globalmente precisamos. Entretanto, nos lugares por onde passou o DNJ, despertou a sociedade para aquela problemática, estimulou o debate entre @s jovens e provocou a igreja ser mais Igreja.
Os lugares do DNJ de Belém se cruzam com as chacinas ocorridas na periferia de nossa cidade, inclusive o mesmo lugar (Icoaraci) e mês (novembro) onde será celebrado o DNJ 2015. É sabido que desde setembro, a PJA tem realizado nos grupos de jovens, paróquias e regiões episcopais, encontros preparatórios (Pré-DNJ) para esse momento. Na programação divulgada, está prevista uma caminhada saindo da Paróquia Nossa Senhora de Fátima rumo à igreja matriz de São João Batista e Nossa Senhora das Graças, onde acontece missa e show. Que neste caminho planejado, a diversidade juvenil possa ser profética, denunciando a violência e anunciando uma cultura de paz, plantando sementes de uma nova sociedade, atent@s às palavras de Santa Clara: “Não perca de vista seu ponto de partida”.

Desastre em MG alerta para urgência do debate sobre modelo de desenvolvimento





foto © Ricardo Moraes / Reuters<br>Fonte: http://www.tsf.pt
O rompimento de duas barragens de rejeitos de minério de ferro da empresa Samarco, em Minas Gerais, é um exemplo de como o atual modelo de desenvolvimento brasileiro é um risco para o meio ambiente e a própria vida das pessoas. O desastre criou uma enxurrada de lama que cobriu o distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, e contaminou 500 km do rio Doce – cujo vale deu nome à gigante da mineração, uma das proprietárias da Samarco. O número de desabrigados chega a 660, e ao menos seis mortes e 19 desaparecimentos já foram confirmados – números que podem estar subestimados.

“Se desenvolvimento é crescimento econômico – como diz a lógica do produtivismo-consumismo –, há que extrair cada vez mais minérios, mesmo sabendo que isto poderá ter consequências nefastas para os seres humanos, como acaba de provar, mais uma vez, o grave acidente ocorrido em Minas Gerais. Com esta forma de desenvolvimento, além da perda de vidas, estamos atacando a nossa água doce, uma das maiores riquezas que temos, com produtos químicos, tóxicos”, afirma Ivo Lesbaupin, diretor executivo da Abong e secretário executivo do Iser Assessoria.

Ele é o idealizador do seminário “Desenvolvimento em Disputa: Por uma economia a serviço da vida”, que acontece em Brasília, nos dias 17 e 18 de novembro. Organizado pela Abong e o Iser Assessoria (ONG do Rio de Janeiro), em parceria com a Frente Parlamentar Ambientalista e a Frente Parlamentar em Defesa das Organizações da Sociedade Civil, o evento é aberto a participação de todos.

Em cinco mesas, o seminário vai discutir alternativas transformadoras para temas fundamentais de nossos dias, como a questão da energia, o uso racional da água, a reinvenção da democracia e a superação do modelo consumista de nossa economia. O evento acontece no auditório do Hotel Garvey, em Brasília, mas terá um momento especial: a discussão a respeito da democracia será realizada na Câmara dos Deputados, buscando levar as posições da sociedade civil até os representantes eleitos.

Na entrevista abaixo, Ivo defende o tema como fundamental para o momento atual do Brasil e cobra uma tomada de consciência sobre a gravidade da situação. “Não basta acrescentar o meio ambiente como mais um elemento a ser considerado: toda a nossa economia deve ser ecológica, se quisermos garantir que a natureza continue a nos oferecer condições de vida”, sustenta.

Leia a íntegra da entrevista:

Qual a importância deste evento? Por que discutir um novo modelo de desenvolvimento é importante nesse momento do Brasil?

Porque a situação ecológica é muito grave, particularmente no Brasil. Todos temos percebido e sentido as mudanças climáticas que estão ocorrendo: eventos extremos têm ocorrido com frequência cada vez maior (inundações, secas, falta d’água em grandes cidades, para dar alguns exemplos). Estas mudanças têm a ver com o nosso modelo de desenvolvimento. Este modelo implica explorar cada vez mais os recursos naturais, sem prestar atenção aos limites da natureza. Segundo Antonio Nobre, o desmatamento acumulado na Amazônia até 2013 foi o correspondente à área de três estados de São Paulo. A Amazônia é a fonte de nossas chuvas. E por que o desmatamento? Para vender madeira, claro, mas, sobretudo para ampliar a área do agronegócio (gado, soja para exportação, etc.). E para realizar megaprojetos de usinas hidrelétricas, supostamente porque esta é a única ou a melhor forma de produzir energia neste país ensolarado que é o Brasil.

O desastre da Vale do Rio Doce, em Minas Gerais, tem algo a ver com essa discussão?

Se desenvolvimento é crescimento econômico – como diz a lógica do produtivismo-consumismo –, há que extrair cada vez mais minérios, mesmo sabendo que isto poderá ter consequências nefastas para os seres humanos, como acaba de provar, mais uma vez, o grave acidente ocorrido em Minas Gerais. Com esta forma de desenvolvimento, além da perda de vidas, estamos atacando a nossa água doce, uma das maiores riquezas que temos, com produtos químicos, tóxicos. Já não temos uma crise hídrica? O modo como tratamos a água está deteriorando a sua qualidade e reduzindo sua capacidade de regeneração.

Precisamos reverter este processo. Há outras formas de produzir energia que são renováveis e não exigem desmatamento, não atingem os povos indígenas e as populações ribeirinhas, que vivem dos rios, e também não prejudicam os próprios rios. Nós não temos de “explorar” a Terra, temos de “cuidar” da Terra: dela dependemos para viver.

Há formas alternativas de produzir e de consumir que fazem bem, que não prejudicam – e já existem, já são praticadas. É possível produzir alimentos sem agrotóxicos, sem transgênicos, aí está a agroecologia para provar. E não só na agricultura, também na indústria, no transporte e outros setores.

Por que fazer um momento no Congresso Nacional?

Este seminário está sendo feito em parceria com a Frente Parlamentar Ambientalista e com a Frente Parlamentar em defesa das Organizações da Sociedade Civil. As decisões são tomadas a nível do poder legislativo e do poder executivo: é fundamental que nossos parlamentares participem destes debates, tomem consciência da gravidade da situação em que vivemos e contribuam para mudar. Não basta acrescentar o meio ambiente como mais um elemento a ser considerado: toda a nossa economia deve ser ecológica, se quisermos garantir que a natureza continue a nos oferecer condições de vida.

Fonte: https://www.observatoriosc.wordpress.com

“O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão” (Mc 13, 24-32)


Cerezo Barredo<br>Fonte: http://www.godgossip.org/
Este texto nos apresenta diversas dificuldades de interpretação, pois está saturado com conceitos apocalípticos, referências veladas a possíveis eventos históricos, e referências tiradas de escritos do tempo do Antigo Testamento, muitas das quais desconhecidas para nós.  Porém a sua mensagem central fica clara – o triunfo final do Filho do Homem, mandando por Deus para estabelecer o seu Reino.  A linguagem vetero-testamentária de sinais cósmicos, a figura do Filho do Homem e a reunião dos eleitos de Deus são unidas em um contexto novo, em que a vinda escatológica de Jesus como Filho do Homem se torna o evento central.  A sua vinda gloriosa no fim dos tempos servirá como prova da vitória de Deus – e a expectativa desta chegada serve como base da vigilância paciente que é recomendada aos discípulos ao longo de todo o Discurso Escatológico de Marcos.

Os sinais cósmicos que antecederão o fim fazem referência a textos do Antigo Testamento: Is 13, 10, Ez 32,7; Am 8,9; Jl 2,10.31; 3,1.5; Is 34,4; Ag 2,6.21;  Mas nenhum texto do Antigo Testamento se refere à vinda do Filho do Homem – esta é uma novidade do Evangelho.  A lista desses sinais é uma maneira de dizer que toda a citação assinalará a sua vinda final.  A descrição da chegada do Filho do Homem, rodeado das nuvens, é tirada do livro de Daniel 7,13, mas aqui se refere claramente a Jesus e não à figura angélica “em forma humana” do livro apocalíptico de Daniel.  A ação de Jesus em reunir os eleitos é o oposto de Zc 2,10.  Este reunir-se dos eleitos do seu povo por parte de Deus se encontra em Dt 30,4; Is 11,11.16; 27,12. Ez 39,7 etc. – mas nunca é o Filho do Homem que faz esse trabalho no Antigo Testamento.

A segunda parte do texto consiste em uma parábola (vv. 28-29), um ditado sobre a hora do fim (v 30), sobre a autoridade de Jesus (v. 31) e de novo sobre a hora (v 32).   Nem sempre fica claro a que se refere – o que se fala sobre essas coisas acontecerem “nessa geração” tem como contrabalanço o v. 32 que diz que somente Deus sabe a hora exata.  A parábola sobre os sinais claros da chegada do fim (vv. 28-29) tem em contraposição a parábola da vigilância constante (vv. 33-37). Mas continua clara a mensagem básica – a vitória final do projeto de Deus, concretizada através de Jesus, o Filho do Homem. Mas a certeza dessa vitória não dispensa a atitude de vigilância constante por parte dos discípulos, para que não se desviem do caminho.

Pode parecer confuso o nosso texto – e para nós hoje, de certa forma, o é.  Mas, se inserido no contexto do Discurso Escatológico (referente aos tempos finais) do Evangelho, nos traz uma mensagem de esperança e uma advertência.  A esperança nasce do fato de que a vitória de Deus é garantida – um elemento fundamental em todo apocalipticismo.  A advertência está na necessidade de vigilância constante, para que não percamos a hora do Filho. Em um mundo de desesperança e falta de ânimo por parte de muitos, o texto nos convida como discípulos, a uma atitude positiva que nos leve a um engajamento maior em prol da construção do Reino entre nós.  Mas também nos desafia para que estejamos sempre vigilantes para não sermos cooptados pela sociedade vigente, opressora e consumista, que muitas vezes se baseia em princípios contrários aos do Reino de Deus.  As palavras de Jesus têm um valor permanente, para que possamos julgar as diversas propostas de vida que o mundo nos apresenta.  “O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão”.
 
Pe. Tomaz Hughes SVD
thughes@netpar.com.br 

Lei sobre direito de resposta é sancionada pela presidenta





O direito de resposta garante pluraridade na mídia?<br>Fonte: http://www.ecosdanoticia.net.br
O projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional que regulamenta o direito de resposta a quem se sentir ofendido por algum veículo de imprensa foi sancionado pela presidenta Dilma Rousseff, nesta quinta-feira (12).

O direito de resposta será garantido quando uma reportagem atentar “ainda que por equívoco de informação, contra a honra, a intimidade, a reputação, o conceito, o nome, a marca ou a imagem de pessoa física ou jurídica identificada ou passível de identificação”, aponta o texto.

Ao ofendido, caso se conceda o direito de resposta, vai ser garantido o direito de publicação da resposta com os mesmos “destaque, publicidade, periodicidade e dimensão” da reportagem, tanto no veículo que originalmente divulgou a matéria quanto em outros que a tenham replicado.
     
O reclamante terá 60 dias a partir da veiculação da reportagem para solicitar o direito de resposta diretamente ao órgão de imprensa ou à pessoa jurídica responsável. Caso a resposta não seja publicada sete dias após o pedido, o reclamante poderá recorrer à Justiça.

A partir do ajuizamento da ação, o juiz terá 30 dias para proferir a sentença. Nesse período, vai citar o órgão de imprensa para que explique as razões pelas quais não veiculou a resposta e para que seja apresentada a contestação à reclamação.

A sanção contou com um veto, que dispunha que a pessoa ofendida pudesse "dar a resposta ou fazer a retificação pessoalmente" no rádio ou na TV. Na justificativa para o veto, Dilma disse que “ao não definir critérios para a participação pessoal do ofendido, o dispositivo poderia desvirtuar o exercício do direito de resposta ou retificação".

Rosane Bertotti, coordenadora-geral do FNDC, no site da entidade, comentou os avanços com a nova lei: "temos um vácuo há dez anos, e durante esse tempo muita gente teve a reputação grosseiramente atacada por veículos de comunicação que não prezam pela apuração em lugar do sensacionalismo e da defesa de seus interesses, que muitas vezes são também os interesses de grupos políticos e empresariais que não têm compromisso com a verdade ou com os interesses da população".

Já Renata Mielli, secretária-geral do FNDC e do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, disse que “em meio a todo o conservadorismo político que rechaça as pautas relativas à democratização da comunicação, a regulamentação do direito de resposta nos mostra que a mobilização e a pressão social sobre o Congresso Nacional ainda é eficaz”.

Fonte: http://www.brasildefato.com.br

Mercado da fé , por Frei Betto




Jesus Mafa
Como os supermercados, as Igrejas disputam clientela. A diferença é que eles oferecem produtos mais baratos e, elas, prometem alívio ao sofrimento, paz espiritual, prosperidade e salvação.
Por enquanto, não há confronto nessa competição. Há, sim, preconceitos explícitos em relação a outras tradições religiosas, em especial às de raízes africanas, como o candomblé e a macumba, e ao espiritismo.
Se não cuidarmos agora, essa demonização de expressões religiosas distintas da nossa pode resultar, no futuro, em atitudes fundamentalistas, como a "síndrome de cruzada", a convicção de que, em nome de Deus, o outro precisa ser desmoralizado e destruído.
Quem mais se sente incomodada com a nova geografia da fé é a Igreja Católica. Quem foi rainha nunca perde a majestade... Nos últimos anos, o número de católicos no Brasil decresceu 20% (IBGE, 2003). Hoje, somos 73.8% da população. E nada indica que haveremos de recuperar terreno em futuro próximo.
Paquiderme numa avenida de trânsito acelerado, a Igreja Católica não consegue se modernizar. Sua estrutura piramidal faz com que tudo gire em torno das figuras de bispos e padres. O resto são coadjuvantes. Aos leigos não é dada formação, exceto a do catecismo infantil. Compare-se o catecismo católico à escola dominical das Igrejas protestantes históricas e se verá a diferença de qualidade.
Crianças e jovens católicos têm, em geral, quase nenhuma formação bíblica e teológica. Por isso, não raro encontramos adultos que mantêm uma concepção infantil da fé. Seus vínculos com Deus se estreitam mais pela culpa que pela relação amorosa.
Considere-se a estrutura predominante na Igreja Católica: a paróquia. Encontrar um padre disponível às três da tarde é quase um milagre. No entanto, há igrejas evangélicas onde pastores e obreiros fazem plantão toda a madrugada.
Não insinuo assoberbar ainda mais os padres. A questão é outra: por que a Igreja Católica tem tão poucos pastores? Todos sabemos a razão: ao contrário das demais Igrejas, ela exige de seus pastores virtudes heróicas, como o celibato. E exclui as mulheres do acesso ao sacerdócio. Tal clericalismo trava a irradiação evangelizadora.
O argumento de que assim deve continuar porque o Evangelho o exige não se sustenta à luz do próprio texto bíblico. O principal apóstolo de Jesus, Pedro, era casado (Marcos 1, 29-31); e a primeira apóstola era uma mulher, a samaritana (João 4, 28-29).
Enquanto não se puser um ponto final à desconstrução do Concílio Vaticano II, realizado para renovar a Igreja Católica, os leigos continuarão como fiéis de segunda classe. Muitos não têm vocação ao celibato, mas sim ao sacerdócio, como acontece nas Igrejas anglicana e luterana.
Ainda que Roma insista em fortalecer o clericalismo e o celibato (malgrado os escândalos frequentes), quem conhece uma paróquia efervescente? Elas existem, mas, infelizmente, são raras. Em geral, os templos católicos ficam fechados de segunda à sexta (por que não aproveitar o espaço para cursos ou atividades comunitárias?); as missas são desinteressantes; os sermões, vazios de conteúdo. Onde os cursos bíblicos, os grupos de jovens, a formação de leigos adultos, o exercício de meditação, os trabalhos voluntários?
Em que paróquia de bairro de classe média os pobres se sentem em casa? Não é o caso das Igrejas evangélicas, basta entrar numa delas, mesmo em bairros nobres, para constatar quanta gente simples ali se encontra.
Aliás, as Igrejas evangélicas sabem lidar com os meios de comunicação, inclusive a TV aberta. Pode-se discutir o conteúdo de sua programação e os métodos de atrair fiel. Mas sabem falar uma linguagem que o povo entende e, por isso, alcançam tanta audiência.
A Igreja Católica tenta correr atrás com as suas showmissas, os padres aeróbicos ou cantores, os movimentos espiritualistas importados do contexto europeu. É a espetacularização do sagrado; fala-se aos sentimentos, à emoção, e não à razão. É a semente em terreno pedregoso (Mateus 13, 20-21).
Não quero correr o risco de ser duro com a minha própria Igreja. Não é verdade que ela não tenha encontrado novos caminhos. Encontrou-os, como as Comunidades Eclesiais de Base. Infelizmente não são suficientemente valorizadas por ameaçarem o clericalismo.
Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Leonardo Boff, de "Mística e Espiritualidade" (Garamond), entre outros livros. 

Fonte: Frei Betto / Brasil de Fato

Brasil é o quinto país mais violento para mulheres A taxa de homicídios de mulheres no país cresceu 8,8% entre 2003 e 2013




violência contra mulheres no Brasil<br>Fonte: http://www.sigajandira.com.br
O estudo “Mapa da Violência 2015 – Homicídio de Mulheres” revelou que o Brasil é o quinto país mais violento para mulheres de um total de 83 nações.

Ainda de acordo com o estudo, produzido pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais e divulgado nesta segunda-feira, 9, a taxa de homicídios de mulheres no Brasil cresceu 8,8% entre 2003 e 2013: de 4,4 para cada 100 mil habitantes para 4,8 para cada 100 mil habitantes.

Em média, 11 mulheres foram mortas por dia no Brasil no período analisado, sendo que 55% delas eram negras.

O Mapa da Violência 2015 mostra ainda que a taxa de homicídios de mulheres chegou a registrar queda entre 2006 e 2007, logo após a entrada em vigor da Lei Maria da Penha, que torna mais rigorosas as punições para casos de violência contra a mulher. A taxa, no entanto, voltou a subir no ano seguinte à implementação da lei.

Em entrevista ao Portal Uol, o coordenador do estudo, Julio Jacobo Waiselfisz, diz que o aumento nas taxas de homicídios de mulheres segue a tendência de aumento da violência no Brasil. Ele ressalta, no entanto, que o machismo ainda é o motivo da maioria dos assassinatos de mulheres no país.

“Até pouco tempo, havia uma justificativa legal para o homem matar uma mulher que o traísse, por exemplo. É uma questão cultural que você não muda como quem muda de roupa. O Brasil é uma sociedade extremamente patriarcal”, afirma Waiselfisz.

O estudo revelou também que 50,3% dos assassinatos de mulheres no país em 2013 foram praticados por familiares, sendo 33,2% dos casos cometidos pelo próprio parceiro ou ex-parceiro.

O Mapa da Violência 2015 mostra que o Brasil só está atrás de Rússia (4º), Guatemala (3º), Colômbia (2º) e El Salvador (1º) no ranking internacional de violência contra a mulher.

Fonte: http://www.opiniaoenoticia.com.br

Integração entre religiões para superar entraves históricos

blog pjoteiro

Reprodução<br>Fonte: http://www.conic.org.br/
"É preciso assumir que as religiões são diferentes e, justamente por isto, são preciosas e necessárias no mundo plural e diverso em que vivemos. O respeito à religião do outro/da outra é o maior testemunho de fé que uma pessoa pode dar”. Quem defende é a diretora executiva da Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), reverenda Sônia Mota. Em entrevista exclusiva à Adital, Sônia, que é teóloga e membro da Igreja Presbiteriana Unida, afirma que a segregação, o preconceito, os atos de vandalismo praticados contra espaços sagrados, a violência psíquica, simbólica e física, que vitimizam as pessoas, são amostras dessa forma exclusivista de se perceber a religião.
 
Mais do que a simples convivência, a integração e o diálogo para a superação de conflitos entre as instituições que representam as variadas religiões no país são meios para a superação de entraves históricos. "Ele possibilita questionar e criticar aspectos da própria religião e, se for preciso, estabelecer outras formas de convivência, em que todos e todas tenham seus direitos respeitados e possam viver em paz”, diz a diretora da Cese, que é adepta da Teologia da Libertação.
 
Assunto discutido na 15ª edição da Campanha Primavera para a Vida, com o tema "Eu respeito a diversidade religiosa. E você?”, promovida pela Cese, o reconhecimento da pluralidade religiosa é um ponto fundamental para que todas as religiões possam se manifestar e serem incluídas nas políticas públicas de Estado. No Brasil, que constitucionalmente se afirma como laico, a reverenda destaca que o que se tem visto são representantes do Poder Legislativo e do Judiciário atuando, no exercício das suas funções, a partir de seus valores e crenças religiosas.
 
"Um Estado laico deveria pautar suas políticas públicas a partir da necessidade e dos anseios dos cidadãos e cidadãs, manifestados por meio do voto, plebiscito ou outra forma de expressão da vontade popular, e não baseados numa religião específica”, ressalta Sônia. Confira:
 
ADITAL - O tema da 15ª edição da Campanha Primavera para a Vida é "Eu respeito a diversidade religiosa. E você?”. O que vocês compreendem como "respeito” nesse contexto e como promovê-lo entre os povos e instituições?
 
Sônia Mota - Quando escolhemos o tema da Campanha deste ano, conscientemente, optamos pela palavra "respeito”, por entendermos que esta deve ser a postura de quem, independentemente da fé que professa, é capaz de acolher a alteridade e perceber a riqueza e peculiaridade de outras tradições religiosas. Respeitar a opção de fé da outra pessoa é acolher positivamente a diversidade religiosa como expressão da vontade de Deus, que também se manifesta por meio da riqueza da diversidade de culturas e religiões. É preciso assumir que as religiões são diferentes e, justamente por isto, são preciosas e necessárias no mundo plural e diverso em que vivemos. O respeito à religião do outro/da outra é o maior testemunho de fé que uma pessoa pode dar.
 
Não sei se temos a receita de como "promover o respeito entre povos e instituições”. A nossa forma de dar a nossa contribuição é promover, incentivar, participar e estabelecer fóruns de diálogo e de coexistência religiosa, por meio de campanhas e atividades, nas quais as diversas religiões possam dialogar e agir em conjunto. Também apoiamos pequenos projetos e ações de fortalecimento da defesa e do diálogo religioso.
 
No Brasil, existem várias iniciativas de diálogo entre religiões, e também existem ações concretas acontecendo como a marcha das religiões contra a intolerância religiosa; ações em defesa de povos tradicionais e do direito a seus territórios — como, recentemente, a Missão Ecumênica em defesa dos Guarani-kaiowá, no [estado do] Mato Grosso do Sul; e ações em defesa dos imigrantes e contra a xenofobia. Muitas vezes, uma ação concreta em defesa da vida e dos direitos é o início de um diálogo e, de repente, percebemos que estamos unidos por uma solidariedade e pelo compromisso incondicional com a defesa de direitos.
 
ADITAL - A intolerância religiosa parte do pressuposto de que a religião do outro é pecadora e deve ser exterminada, para que o outro renuncie e se adeque a uma religião alheia. Quais os impactos negativos que essa perspectiva de fé exclusivista pode provocar na vida das pessoas, especialmente se a perseguição (com ou sem conversão) ocorre por meio da coerção e violência?
 
SM - A base de sustentação das religiões deveria ser o amor e o respeito. Lamentavelmente, muitas religiões estão se deixando influenciar por discursos e práticas que fomentam a intolerância e a demonização da religião do/a outro/a. Temos assistido a casos de grupos extremistas crescendo e atrocidades sendo cometidas nos últimos tempos. A mais visível talvez sejam as atrocidades praticadas pelos fanáticos de grupos, como o Estado Islâmico, Boko Haram. Vemos essa posição de intolerância e demonização até mesmo entre cristãos de diferentes denominações.
 
Embora o Brasil seja um país majoritariamente cristão, é fato que o pluralismo religioso faz parte da nossa cultura. Esta diversidade religiosa, que deveria ser algo a nos orgulhar, torna-se um problema quando posturas exclusivistas tentam apagar a riqueza da diversidade de olhares e de maneiras de viver a fé. Exclusivismos, verdades absolutas e inquestionáveis, demonização da religião do outro não contribuem para uma cultura de paz, que é o que, a princípio, as religiões defendem. Ao contrário, este tipo de atitude só gera violência.
 
Aliás, temos assistido a inúmeros casos de conflitos religiosos também aqui no Brasil, em especial contra religiões de matriz africana. A segregação, o preconceito, os atos de vandalismo praticados contra espaços sagrados, a violência psíquica, simbólica e física, que vitimizam as pessoas, são amostras dessa forma exclusivista de se perceber a religião. O que mais causa espanto é que muitas dessas atitudes são tomadas em nome de Deus. Mas, pergunta-se, de que Deus estamos falando? Posições desrespeitosas, violentas, não condizem com nenhuma religião, já que todas elas têm como princípio a promoção da paz. Como pastora de uma igreja protestante e diretora de uma organização ecumênica, me sinto profundamente atingida quando fatos dessa natureza acontecem. Essas pessoas, esses grupos definitivamente não representam o Deus de Jesus Cristo que eu professo.
 
ADITAL - Como isso se dá especificamente na América Latina, majoritariamente cristã, católica, porém sincretizada com religiões de referência africana e ameríndia, mas, nem por isso, livre de intolerância religiosa?
 
SM – Aqui, é bom fazer um esclarecimento. O sincretismo foi uma forma encontrada pelos africanos que aqui foram escravizados para desviarem a atenção da Igreja, e como forma de evitar perseguições por parte dos jesuítas e senhores de escravos, que eram contra a prática da religião que os negros trouxeram da África. Hoje, esse sincretismo não é mais aceito pelas religiões de matriz africana.
 
A Mãe Stela de Oxóssi, do terreiro Ilé Axé Opô Afonjá, em São Gonçalo do Retiro, na cidade de Salvador (Estado da Bahia), uma das lideranças mais respeitadas do Candomblé, se coloca contra esta tradição. Para ela, sincretismo "é a fusão de duas religiões, uma mistura sem base que não corresponde a nada. Então, não adianta dizer que tal caboclo corresponde a um santo, que tal orixá a outro santo, se não existe base que fundamente isso”. Essa posição mostra a independência das religiões de matriz africana com relação ao Catolicismo e a necessidade de colocar cada religião em seu lugar, com seus símbolos e tradições.
 
Mas é verdade que aqui, na América Latina, existe uma intolerância muito grande, especialmente contra as religiões de matriz africana e as religiões ameríndias. Porém, é importante desvelar o que vem junto com esta intolerância. Nunca ela é contra uma religião hegemônica, é sempre contra religiões minoritárias, se considerarmos os dados oficiais do censo e, no caso das religiões de matriz africana, a intolerância vem acompanhada também de forte conteúdo racista.
 
ADITAL - A trajetória missionária cristã contém diversos períodos em que praticou a perseguição e a repressão às demais religiões e orientações espirituais, especialmente a partir do momento em que a Igreja Católica se tornou hegemônica no mundo ocidental. Como a prática missionária tem sido pensada hoje?
 
SM - O capítulo da ação missionária cristã nos envergonha. De uma religião perseguida em seus primórdios, o Cristianismo passou a ser perseguidora logo que se tornou a religião oficial no Império Romano. A cruz e a espada fazem parte de uma história de sangue e dor para muitos povos. Essa forma de atuação missionária não foi exclusividade da Igreja Católica. Muitas missões protestantes também impuseram sua crença, seus ritos e símbolos, desrespeitando culturas, ignorando tradições e sufocando identidades.
 
Infelizmente, ainda hoje, essa é a prática de muitas igrejas que se dizem cristãs. Lamentavelmente, nas suas ações missionárias, muitas igrejas têm-se revelado ainda bastante intolerantes. No caso do Brasil, em especial, essa perseguição tem tido endereço certo: são as religiões de matriz africana e indígenas. A utilização de textos bíblicos interpretados sem nenhuma contextualização, nem uma interpretação séria, infelizmente, tem servido para justificar e legitimar casos de violência e desrespeito. Porém, na própria Bíblia, é possível encontrar inúmeros textos que desconstroem esse agir e nos apontam para o diálogo e o respeito ao diferente e a outras culturas.
 
No entanto, há esforços acontecendo em todo mundo para que haja uma outra visão de missão. O surgimento do Conselho Mundial de Igrejas se dá num contexto de disputas de agências missionárias. Depois de um longo período de brigas, as igrejas deram-se conta que este era um mau testemunho. Embora ainda tenhamos muitas disputas no campo missionário, existem igrejas e organizações ecumênicas comprometidas com outra postura.
 
A ação missionária diante de um mundo plural e globalizado não pode ser marcada pela força hegemônica de uma igreja ou de uma tradição religiosa. Ela precisa estar alicercada no espírito do diálogo e do respeito às tradições e, acima de tudo, pautada na responsabilidade com o mundo habitado: a oikoumene. Isto significa uma postura de responsabilidade em favor do bem estar de toda criação.
 
Neste sentido, a motivação missionária não é a "conversão” do/a outro/a para a minha religião ou a implantação de igrejas. A motivação é o amor e a meta é o Reino de Deus e a inclusão de todos e todas na promoção da justiça, da paz, da compaixão, do respeito e da fraternidade entre os povos. Uma ação missionária ecumênica exige uma postura política diante do mundo. Exige que, muitas vezes, façamos crítica à própria religião, quando ela passa a compactuar com esquemas que levam à morte, que geram violência e que destroem povos, culturas e tradições.
 
ADITAL - Ainda hoje, há missões de religiões cristãs, especialmente evangélicas, que se empenham em ações de evangelização de povos indígenas. Como vê esse tipo de prática na atualidade?
 
SM - Com muita atenção e preocupação. Não quero afirmar aqui que toda ação missionária tem sido prejudicial. Até acredito que tenha pontos positivos, mas me preocupa uma ação missionária cuja meta é implantar igrejas nos territórios indígenas, sem respeitar as tradições que já existem. Estive, na última semana [início de outubro], participando de uma Missão Ecumênica no Mato Grosso do Sul, em solidariedade aos Guarani-Kaiowá, mas estive também com outras etnias. Pude escutar algumas vozes lamentando que alguns grupos estão perdendo sua identidade e sua força por causa do abandono das tradições, causando até mesmo desagregação entre os próprios grupos.
 
Nós sabemos que, quando os invasores europeus chegaram ao território latino-americano, a primeira coisa que fizeram foi tirar a língua e a religião dos povos tradicionais e, assim, os enfraqueceram, ficando mais fácil dominá-los. Tenho muita preocupação que isto esteja acontecendo de novo. Me encantou a forma como os Guarani-Kaiowá conservam suas danças, seus ritos e sua forma de viverem a sua religiosidade. É algo que nos toca e também nos ensina como, mesmo diante de tanta dor e sofrimento, eles tiram forças para seguirem lutando e alimentando a esperança.
 
Na minha opinião, a melhor ação missionária que podemos prestar aos povos indígenas é caminhar ao lado deles, denunciando os descasos, assassinatos e toda sorte de violência a que estão sendo submetidos. Uma ação missionária que dialogue e respeite os seus princípios, a sua religiosidade, seus usos e costumes.
 
A Cese realizou, de 07 a 08 de outubro, em parceria com o Centro de Estudos Bíblicos (Cebi) e o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC), a Missão Ecumênica em apoio aos Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul. Além de influenciar para instalação da CPI [Comissão Parlamentar de Inquérito] do Genocídio Indígena, a ação também apoia a campanha de boicote à carne e à soja produzidas no Estado, que estão manchadas com sangue dos povos originários. Esta campanha está tendo repercussão em outros países e esperamos causar impacto aqui no Brasil, pois queremos ver os direitos indígenas respeitados e assegurados. Considero esta uma boa ação missionária.
 
ADITAL - De que maneira o diálogo inter-religioso pode contribuir para superar violências, preconceitos, segregação de pessoas e negação de identidades?
 
SM - Como disse o Dalai Lama: "é muito importante entender que um relacionamento entre várias religiões é essencial para que diferentes grupos religiosos possam trabalhar juntos e realizar um esforço comum para o benefício da humanidade”. Seguindo esta lógica, é importante que as diferentes religiões busquem uma pauta comum em favor da vida e que, juntas, apontem caminhos que promovam a paz e a justiça. A própria Cese surge em 1973 a partir desta visão, ou seja, igrejas que se unem para, juntas, atuarem na defesa e garantia de direitos.
 
As grandes questões que afetam a humanidade e toda a criação requerem também uma resposta teológica. A abertura para um diálogo honesto, numa perspectiva libertadora, pode ajudar as diversas tradições religiosas a se abrirem para uma escuta verdadeira, na qual o outro/a outra não é meu adversário, meu oponente. O diálogo inter-religioso, embora ainda seja um desafio a ser vencido, é fundamental para os tempos atuais. O teólogo católico Hans Küng afirma que a paz no mundo é impossível sem a paz entre as religiões, e que a paz entre as religiões é impossível sem o diálogo entre as mesmas.
 
ADITAL - Qual o papel das instituições religiosas na promoção da integração das religiões? Imagino que a superação dos conflitos vai além da simples convivência ecumênica.
 
SM - Elas têm um papel fundamental para essa integração que, certamente, vai muito além da convivência. Existem, sim, muitos aspectos que são trabalhados para a superação dos conflitos. Acho que é importante e honesto reconhecer que temos diferenças, mas os diálogos bilaterais entre as religiões têm sido importantes para a superação de entraves históricos.
 
Muitas iniciativas ao redor de todo mundo têm inspirado as religiões a seguirem o caminho da superação de conflitos. Sabemos que, na Faixa de Gaza [Palestina], existem programas de cooperação entre palestinos e judeus pelo fim do conflito na região. Este é um bom exemplo para muitas religiões. Aqui no Brasil, o CONIC do Rio de Janeiro lançou uma campanha de doações para reconstruir um terreiro de Candomblé que foi destruído pelo fogo, por conta de um ato de intolerância religiosa. A Cese, quando apoia rodas de diálogo e promove encontros, jornadas e ações de diálogo e convivência. Tenho certeza de que outros exemplos tão fortes quanto estes, para a superação de conflitos, estão acontecendo em diversos lugares do mundo e que nos servem de inspiração.
 
O ecumenismo vai muito além da convivência ou do anseio pela unidade dos cristãos ou, ainda que desejado, vai além do diálogo entre judeus e muçulmanos e além da convivência pacífica entre cristãos e seguidores das religiões de matriz africana. O ecumenismo é a postura que nos impulsiona para estabelecermos outras formas de viver e estar no mundo. Ele possibilita questionar e criticar aspectos da própria religião e, se for preciso, estabelecer outras formas de convivência, nas quais todos e todas tenham seus direitos respeitados e possam viver em paz.
 
ADITAL - Nossas sociedades estão em contínuo processo de mudança e, com isto, nossas religiões. Como isso atua no movimento de interconexão/associação religiosa, especialmente no contexto da América Latina?
 
SM - Se as religiões estão em constante processo de mudança, para adequarem-se às novas questões que surgem da sociedade e da vida das pessoas, isto deve ser considerado positivo. Negativo seria permanecer repetindo dogmas do passado, que passam ao largo das necessidades humanas. O problema que surge com as mudanças cada vez mais rápidas dentro de um inegável processo de globalização é que grupos religiosos se sentem ameaçados em sua identidade, com a relativização de valores também religiosos que acompanha essas mudanças sociais e, por medo, buscam construir barreiras em torno de suas convicções.
 
Este é um dos motivos mais fortes que fizeram recrudescer os atuais fundamentalismos. No entanto, as mudanças com a globalização também nos fazem ver os problemas que temos em comum, oportunizando um trabalho, em conjunto, de religiões e igrejas em benefício da coletividade, seja mundial, seja continental ou local.
 
ADITAL - Como avalia a presença da religião no Estado? No caso do Brasil, Estado laico, a forte presença das instituições cristãs, católica e evangélica, em decisões do Legislativo, por exemplo, e no favorecimento de políticas públicas.
 
SM - Vejo com grande preocupação. A laicidade do Estado brasileiro está fortemente ameaçada. Um Estado laico deve zelar, em primeiro lugar, pela livre manifestação de todas as religiões, sem se deixar guiar por pressões religiosas. Em um país que, constitucionalmente, se afirma como laico, temos visto representantes do Poder Legislativo e do Judiciário atuando, no exercício das suas funções, a partir de seus valores e crenças religiosas. Um Estado laico deveria pautar suas políticas públicas a partir da necessidade e dos anseios dos cidadãos e cidadãs, manifestados por meio do voto, plebiscito ou outra forma de expressão da vontade popular, e não baseados numa religião específica.
 
O atentado ao Estado laico tem se manifestado, nos últimos anos, sobretudo, para interferir em políticas públicas no que diz respeito à sexualidade humana. Juízes usam a religião para legitimarem violência doméstica, políticas públicas sobre o corpo e a sexualidade feminina são pautadas por religião, a disputa pelo conceito de família continua usando moldes religiosos. O recém-aprovado Estatuto da Família estipula o conceito de família apenas ao formato restrito à heterossexualidade e à obrigação patriarcal de produzir filhos biológicos, ofende os casais homoafetivos e revela um retrocesso histórico na luta e direitos LGBT [Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros] e de todos os direitos civis e constitucionais. É um projeto baseado em uma interpretação do Evangelho, numa flagrante afronta e violação do Estado laico.
 
No país em que é possibilitado a um parlamentar representar os interesses de sua comunidade de fé, mesmo que o Congresso Nacional e a Corte Suprema sejam instâncias da razão pública, o aspecto religioso foi e continua a ser determinante para a legitimação do poder político. As crenças pessoais de parlamentares tornam-se bandeiras políticas, de forma que estamos continuamente sendo vítimas de um Estado religioso constitucionalmente afirmado e reconhecido como laico. Precisamos discutir, aprofundar e exigir a volta do Estado laico de direito e de fato, ou corremos o risco de instituir aqui uma "cristocracia” no que tem de mais fundamentalista.
 
ADITAL - Qual a importância do reconhecimento e da valorização institucional das religiões em sua diversidade na América Latina?
 
SM - O cenário religioso no mundo globalizado se destaca por sua informalidade, pela diluição de limites rígidos entre igrejas e religiões, pela possibilidade de cada indivíduo, por assim dizer, escolher aspectos de diversas igrejas ou religiões para construir um mosaico próprio de crenças e, assim, pela relativização de valores, antes tidos como absolutos. Esse fenômeno tem aspectos positivos e negativos. Entre os aspectos negativos está a dificuldade de promover um diálogo frutífero com as mais diversas individualidades.
 
E o diálogo ecumênico e inter-religioso, para ser eficaz e transformador, deve poder apoiar-se nas convicções de uma instância que represente um coletivo, ou seja, as igrejas ou religiões devem estar conscientes das suas crenças fundamentais, que as impulsionam a agir de forma profética e transformadora, e devem poder elaborar estratégias para o que consideram sua missão na sociedade. Somente instituições que sejam uma autêntica representação de um coletivo religioso, com convicções próprias, podem discutir, em conjunto com seus pares, estratégias eficazes de transformação. Parodiando Dom Hélder Câmara, os sonhos individuais devem fundir-se num grande sonho coletivo para poderem concretizar-se.


Fonte: http://www.conic.org.br

Cultura do silenciamento prevalece nos casos de violência contra crianças e adolescentes




Violência silenciada<br>Fonte: http://www.meionorte.com
Segundo dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, o crime de negligência foi a principal forma de violência contra crianças e adolescentes até o momento em 2015, concentrando 76,35% de todas as denúncias realizadas pelo Disque 100, serviço de denúncias anônimas. No total, foram 42.114 ligações realizadas para denunciarem crimes contra essa população, até junho de 2015. O montante é 14% menor do que os registros do mesmo período, em 2014, mas essa não é necessariamente uma notícia boa.
O assistente social Júlio Cezar de Andrade, diretor do Conselho Regional de Serviço Social de São Paulo (Cress-SP), avalia que a redução nas denúncias pode não ter relação com a diminuição da violência, mas com o agravamento da cultura de silenciamento. Para ele, esse número pode ser muito maior, já que nem todos os casos são efetivamente denunciados porque, muitas vezes, o autor ou autora da violência faz parte da família da vítima.

"A naturalização da violência e o silêncio que, por vezes, permeiam as relações familiares fazem com que seja difícil que ocorra uma denúncia nos primeiros episódios. Sempre há a esperança de que seja um caso isolado, que não vá se repetir. Vários são os componentes que atuam no fenômeno da violência e todo o cenário contribui para essa questão do silenciamento.”, explica Andrade.

Por causa disso, ressalta o diretor do Cress, é de extrema importância a criação de uma cultura de proteção, que envolva vários atores da sociedade: "É preciso que todos sejam sensibilizados sobre sua obrigação de protegerem as crianças e adolescentes, utilizando as ferramentas de denúncia disponíveis, como o Disque 100, e não naturalizando a violência cotidiana”, ressalta o assistente social.

Tipos de violência

O último balanço divulgado pela Secretaria de Direitos Humanos mostra que as denúncias de crimes contra crianças e adolescentes correspondem a 63% de todas as denúncias realizadas pelo Disque 100, em 2015. No que se refere aos tipos de violência, os dados mostram que a negligência somou 76,35% das denúncias, seguida de violência psicológica (47,76%), física (42,66%), sexual (25%) e outras (8,47%). Ainda para Andrade, esses números refletem a realidade enfrentada pelos/as brasileiros/as.

"Vivemos historicamente em uma realidade de desamparo, em que um Estado ausente mantém a população em aspectos mínimos de condições de trabalho, saúde, educação, moradia e qualidade de vida. Nessas condições, a situação de negligência é associada à falta de acesso a direitos e, portanto, seu enfrentamento deve ser alvo de políticas públicas efetivas”, reforça o diretor do Cress.
Rede de proteção

Constituído pela Lei 8.069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completou 25 anos de existência em julho deste ano. Ainda assim, o assistente social assinala que ele não é seguido como deveria.

"As normas são um passo, mas precisamos de mais centros especializados em crianças e adolescentes e mais equipamentos públicos estatais de fortalecimento de vínculos ,como centros profissionalizantes ou culturais, entre outros, para o atendimento dessa parcela da população. É importante criar uma rede entre governo e sociedade, principalmente hoje, quando as contradições entre capital e trabalho colocam crianças e adolescentes em situação de violência física, doméstica e sexual, trabalho infantil e exploração sexual”, finaliza Andrade. 

Fonte: http://www.adital.com.br/?n=cxb2